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Bystanders

Em qualquer processo de genocídio, serão sempre muitos mais os sujeitos que mantêm uma atitude de passividade do que os diretamente implicados como perpetradores, vítimas ou resistentes e salvadores. Para abordar este fenómeno, o conceito de “bystander” tem vindo a ser crescentemente discutido no âmbito dos estudos sobre o genocídio, com a designação inglesa, de difícil tradução – o “bystander” é o espetador, aquele que está presente e assiste, mas se abstém de intervir –, a tornar-se corrente em diferentes línguas. O “bystander” situa-se, assim, numa ambígua zona cinzenta em que, dadas as circunstâncias, tanto pode resvalar para o papel de perpetrador como assumir uma atitude salvadora ou, por sua vez, ser visado como vítima. Uma característica basilar é o conformismo social: o “bystander”, muitas vezes, legitimamente, está preocupado com a sua própria segurança, incluindo a segurança física, com o seu estatuto e a sua identidade sociais, e tende a ser relutante em assumir um comportamento que vá contra a corrente do status quo, tornando-o, real ou pretensamente, vulnerável. No atual mundo globalizado, também a figura tende a assumir um significado global: em última análise, todo o sujeito que toma conhecimento de processos de violência em massa, em qualquer parte do mundo, abstendo-se de intervir, é um “bystander”. O problema assume, deste ponto de vista, uma importância fundamental no horizonte de uma ética contemporânea.

No contexto do Holocausto, o conceito aplica-se, sobretudo, às largas camadas da população alemã, mas também de outros países sob domínio nazi, que foram testemunhas passivas da violência contra os judeus e outros grupos visados, nomeadamente no âmbito dos processos de deportação. Na medida em que muitos alemães e austríacos foram beneficiários diretos dessa violência, mormente através da apropriação ilegítima de bens, móveis e imóveis, pertencentes às vítimas, a figura do “bystander” aproxima-se, nestes casos, da do cúmplice e perpetrador.

O conceito de “sujeito implicado” recentemente proposto por Michael Rothberg acrescenta densidade à discussão sobre os papéis sociais assumidos em contexto de genocídio e permite abordar o problema do “bystander” num quadro que faz jus à sua complexidade.

 

Referências
     Baum, Steven K. (2008), The Psychology of Genocide: Perpetrators, Bystanders, and Rescuers. Cambridge; New York: Cambridge University Press.
     Cesarani, David; Levine, Paul A. (orgs.) (2002), Bystanders to the Holocaust: a Re-evaluation. London / Portland: Frank Cass.
     Rothberg, Michael (2019), The Implicated Subject. Beyond Victims and Perpetrators. Stanford: Stanford University Press.
     Vetlesen, Arne Johan (2000), “Genocide: A Case for the Responsibility of the Bystander”, Journal of Peace Research, 37(4), 519-532.