(em alemão, Judenrat)
Os Conselhos Judaicos foram órgãos de autoadministração das comunidades judaicas impostos pelas autoridades nazis com vista a, do ponto de vista destas autoridades, permitir um tratamento da “questão judaica” sistemático e facilitado do ponto de vista burocrático. Por outras palavras, tratava-se, como, retrospetivamente, se revela evidente, de propiciar um funcionamento tão eficiente quanto possível da máquina que levaria ao Holocausto. Logo em 6 de abril de 1933, o “projeto de lei para a regulamentação da situação dos judeus” previa uma forma de organização deste tipo. Em Setembro do mesmo ano, foi criada a “Reichvertretung der deutschen Juden” (“Delegação nacional dos judeus alemães”). Após os progroms de Novembro de 1938, Reinhard Heydrich, encarregado por Himmler da “resolução da questão judaica”, promoveu a criação da “Reichsvereinigung der Juden in Deutschland” (“União nacional dos judeus da Alemanha”), fundada na primavera de 1939.
Foi sobretudo no Leste que a forma do Conselho Judaico se disseminou, tornando-se particularmente relevante no âmbito do processo de criação dos muitos guetos em que foi sendo concentrada a população judaica e que, a médio prazo, se revelariam como antecâmaras da deportação para os campos de extermínio. Nos guetos, os conselhos judaicos tornaram-se órgãos de autoadministração, inteiramente dependentes, no entanto, das autoridades nazis. Nomeadamente, o abastecimento em bens essenciais, à cabeça, bens alimentares, mas também recursos médicos e outros, dependia por inteiro das autoridades alemãs, representadas por órgãos de controlo que impunham um sem-número de restrições, ao mesmo tempo que favoreciam o recurso inevitável ao mercado negro, propiciando, assim, a progressiva expropriação dos poucos recursos financeiros ainda detidos pelos habitantes dos guetos. Os conselhos judaicos eram compostos por um número variável de membros, coordenados por um presidente. As sucessivas “ações” e “seleções” que foram tendo lugar, promovendo o processo de deportação ainda antes da completa dissolução dos guetos, foram tendo um impacto cada vez mais notório, em parte, afetando a composição dos conselhos pela deportação de alguns dos seus membros, mas, sobretudo tornando cada vez mais evidente a sua completa impotência perante as medidas das autoridades alemãs e, em última análise, a sua cumplicidade com o processo em curso. Em vários casos, a perceção da inutilidade dos seus esforços e do carácter problemático do papel desempenhado, levaram, na fase terminal dos guetos, a suicídios de presidentes e/ou membros de vários conselhos.
Sobretudo após o processo de Adolf Eichmann em Jerusalém, em 1961, gerou-se uma forte controvérsia sobre o papel dos conselhos judaicos que, pode dizer-se, chegou até hoje e foi potenciada em particular pela crítica severa de Hannah Arendt nalgumas páginas da sua obra, Eichmann em Jerusalém. A avaliação desse papel é sobremaneira complexa. Não só não deve nem pode fazer-se de maneira genérica, já que há muitas especificidades locais a ter em conta, como deve abster-se de projetar um juízo simplista, nomeadamente de ordem moral, numa situação de extrema complexidade, em que os responsáveis pelos conselhos se viam confrontados com a enorme imprevisibilidade do futuro das suas comunidades e, numa situação crescentemente desesperada, eram convocados a atitudes pragmáticas, na tentativa de, ao mesmo tempo que serviam de correias de transmissão do poder nazi, assegurarem a sobrevivência dessas comunidades.
Referências
Lanzmann, Claude (2015), Le dernier des injustes. Paris: Editions Gallimard.
Rabinovici, Doron (2011), Eichmann’s Jews. The Jewish Administration of Holocaust Vienna, 1938-1945. London: Polity Press.
Trunk, Isaiah (1996), Judenrat. The Jewish Councils in Eastern Europe under Nazi Occupation. Lincoln: University of Nebraska Press.