Autores/as: János Bársony e Ágnes Daróczi
Título: Pharrajimos: The Fate of the Roma During the Holocaust [Pharrajimos: O Destino dos Roma durante o Holocausto]
Local de publicação: Nova Iorque, Amesterdão, Bruxelas
Editora: International Debate Education Association
Ano de publicação: 2007
Número de páginas: 256
Tradução: Gábor Komáromy
Edição original, em húngaro: Pharrajimos, romák sorsa a Holokauszt idején. Budapest: L’Harmattan, 2004.
Palavras-chave: Roma e Sinti, Hungria, história oral, memória, genocídio
Índice
Prefácio à edição inglesa
Factos e debates: O Holocausto Roma
Cronologia – o Pharrajimos no Terceiro Reich
Cronologia – o Pharrajimos na Hungria
História dos Roma no século XX e o Pharrajimos
I. Europa
1. História dos Roma europeus da viragem do século até à Segunda Guerra Mundial
2. O Pharrajimos na Europa durante a Segunda Guerra Mundial
II. Hungria
1. Antes da Segunda Guerra Mundial
2. A guerra e o Pharrajimos húngaro
2.1. Roma presos em guetos
2.2. Serviço militar de trabalho forçado
2.3. Campos de trabalhos forçados militares
2.4. Unidades de serviço de trabalho militar
2.5. Campos e guetos fechados de ciganos
2.6. Assassinatos em massa
3. As repercussões do Pharrajimos na Hungria
Iniciativas anticiganas e ataques no condado de Pest sob o vice-tenente László Endre (1928, 1939–1944)
Redação do “Decreto do Ataque Cigano”
As propostas dos administradores do condado de Pest para o Decreto Ministerial
Encarcerar ou segregar
As primeiras propostas anti-Roma de Endre László
Decretos do vice-tenente László Endre e ataques anti-Roma
O assassinato em massa de ciganos em Várpalota e Inota-Lake Grábler no final de janeiro de 1945
Documentos judiciais
Circunstâncias em torno da deportação dos Roma de Székesfehérvár
A questão dos roubos cometidos pelos ciganos de Székesfehérvár
O destino dos ciganos de Várpalota
Execuções
O número das vítimas
Sumário
Um dos campos de matança dos Roma: Komáromi Csillagerőd, outono de 1944
Os primeiros reclusos destinados à deportação
Komárom IV: Csillagerőd
Registo de deportações para Komárom
Condições no cativeiro
Fugas
O número de mortos Roma
Novos transportes humanos para o Reich
Dachau, Fossenbürg e Buchenwald
O destino dos Roma arrastados para a fortaleza
Conclusão
O Holocausto na Poesia Folcrórica Cigana
História oral: Depoimentos pessoais dos sobreviventes
Sra. Vilmos Holdosi (Torony)
Sr. József Kazári (Meggyeskovácsi)
Sr. Károly Komáromi (Kötegyán)
Sra. Jenő Sárközi (Torony)
Sra. István Sztojka (Csepel)
Sra. Angéla “Mici” Lakatos (Székesfehérvár)
Sra. István Pilisi (Budapeste)
Sr. Gyula Balogh (Rákospalota, Budapeste)
Sra. Miklós Murzsa (Újfehértó)
Sra. József Kazárine [nome de solteira Terézia Horváth] (Meggyeskovácsi)
Sra. János Rostás (Budapeste-Kispest)
Sra. Imre Dömötörné [nome de solteira Ilona Lendvai] (Tüskevár)
Lajoskomárom
Pál Macher (PM), presidente da Câmara Municipal de Lajoskomárom
Pal Zsednai (PZ), residente local
Albert Bognár (AB), ex-guarda na Câmara Municipal
Pál Szemerei (PS), ex-motorista
Sra. Lajos Kecskés (LK), residente local
István Czéh e a sua mulher (IC-AC), residentes locais
Piroska Peller (PP), sobrevivente
Lugar a Lugar: Acontecimentos do Pharrajimos
Apêndice: A luta por uma narrativa autêntica do Pharrajimos: ilustrações
Holocausto Roma, História húngara
Holocausto Roma – factos e negações
Uma opinião de especialista
Observações sobre as seções Roma da Exposição Permanente do Holocausto
Teses para o guião dos Roma na Exposição Permanente do Museu do Holocausto
Sinopse
A obra, organizada por dois ativistas e especialistas em questões Roma, propõe-se dar a conhecer um segmento menos conhecido da História da Hungria e mesmo contestado em certos círculos: o Pharrajimos, conceito usado para referir o Holocausto dos Roma e Sinti. Os autores partem do princípio que o Holocausto é mais do que um genocídio, mas um evento particular pela sua dimensão industrial aplicada a uma organização racial. Contestam a historiografia que questiona a dimensão racial do extermínio dos Roma, argumentando que a sua caracterização pelo Terceiro Reich como “coletivo de criminosos” inimigo era racialmente construída: a criminalidade atribuída aos Roma era entendida como um fenómeno com base racial que faria com que o seu extermínio fosse advogado como medida preventiva na luta contra a criminalidade. Enquanto os Judeus eram percecionados como parte de uma conspiração transnacional (judeo-bolchevismo), os Roma eram vistos como um veneno a emanar do interior da sociedade. Por isso, assim argumentam os autores, foram sujeitos a práticas de extermínio industrial como as segundas vítimas do Holocausto.
Assente neste argumento central, a obra descreve o extermínio dos Roma húngaros durante a Segunda Guerra Mundial como parte de uma longa história de perseguição e discriminações que este povo sofreu durante séculos na Hungria, surgindo assim o Holocausto Roma como continuação e agudização de situações anteriores. Argumentam também que o fim do Holocausto não se traduziu para os Roma húngaros no fim das discriminações nem no seu reconhecimento como vítimas do Holocausto. A obra dá a conhecer as especificidades locais que marcam o extermínio de Roma nos vários países em que este ocorreu na Segunda Guerra. A Hungria, ocupada pelas forças do Reich apenas em 1944 (antes era país aliado, mantendo certa autonomia), será um dos países onde a percentagem de Roma assassinados é menor (tanto em termos absolutos como percentuais) do que em países como como a Alemanha, a Polónia ou a Croácia.
Para além da apresentação detalhada dos marcos, legislação e acontecimentos que constituem os momentos centrais do extermínio dos Roma húngaros no contexto mais vasto do extermínio Roma pelo Terceiro Reich, a obra tem ainda uma importante dimensão de história oral, não apenas enquanto fonte de análise historiográfica. Conta com a reprodução de vários testemunhos de sobreviventes e de testemunhas que permitem ao/à leitor/a ter um quadro mais vivo dos acontecimentos.
Por fim, a obra permite perceber certas “disputas pela memória” que acompanharam iniciativas de memorialização do Holocausto na Hungria, nomeadamente a polémica em torno da inclusão (e em que termos) de uma secção sobre os Roma numa exposição sobre o Holocausto na Hungria em 2002 e 2024. No apêndice encontra-se reproduzido o texto de um historiador húngaro que argumentou que as perseguições que vitimaram a população Roma do país não podem ser equipadas ao Holocausto. Seguem-se um texto do autor a contestar esta argumentação, bem textos surgidos no contexto da polémica em torno da Exposição sobre o Holocausto. O último texto da obra define os princípios pelos quais, segundo os autores, se devem reger os esforços de memorialização dos Roma no Museu do Holocausto da Hungria: a possibilidade de apresentar uma narrativa Roma própria que garanta aos Roma lugar como vítimas do Holocausto sem, contudo, silenciar as especificidades das suas experiências, nomeadamente como a sua racialização no Terceiro Reich era distinta da que visava os judeus, e como as experiências dos Roma húngaros têm as suas especificidades dentro do Holocausto Roma.
Excerto
“Então, um mês e meio depois, levaram-nos para Dachau. Meteram-nos em comboios – a todos nós, ciganos e judeus. Quando lá chegámos, já era de noite. Éramos tantos, a sair do comboio. Bebés pequeninos ao colo de mulheres judias, mulheres novas minúsculas, e os filhos choravam e as mulheres choravam: “Por favor, não me levem os bebés.” Elas imploravam, mas tiraram-lhes os filhos mesmo assim. Disseram que iam levá-los para o hospital infantil, aos que estavam doentes, mas nunca mais os viram. Estavam doentes por causa da fome porque também nunca lhes deram comida – Que Deus lhes apodreça as entranhas. Algumas tinham três filhos com elas. Elas traziam malas – tinham trazido tudo, edredons, roupas, tudo para os bebés. Mas não as deixaram levá-las para o campo. [...] Os homens e as crianças foram levados separadamente. Não sabíamos para onde. Nós, as mulheres, fomos deixadas ali. Então mandaram-nos tirar a roupa – consegue imaginar? – entrámos nuas no campo. Que vergonha, principalmente para nós é uma grande vergonha, sabe. Deram-nos aquelas roupas às riscas – sabe, aquelas que os palhaços usam –, mas não tinham botões, só um pedaço de cordão, e tínhamos de as vestir. Deram-nos uns chinelos minúsculos para os pés. Como poderíamos não ter frio? Não era difícil apanhar uma doença quando tínhamos de estar de pé ao frio, na neve, vestidas com aquelas roupas às riscas finas. Era um inverno frio, a neve chegava aos tornozelos, e mesmo assim tínhamos que marchar, porque eles nos batiam. Marchávamos das 12 às 6 da manhã e de manhã, entrávamos mortas de cansaço e caíamos naquela palha minúscula, e quem podia dormia, mas a maioria de nós era mortos-vivos e não conseguia sequer dormir.”
Testemunho da sobrevivente Vilmos Holdosi (pp. 126-127)